quinta-feira, novembro 13, 2008

Especial Banda Desenhada - parte 6 - dose dupla

Nem sei como é que deixei passar tanto tempo desde o meu último especial... Espero compensar o desleixo nos próximos tempos. Hoje o especial é dedicado a artistas com duas ou mais obras que adoro e eu não soube escolher só um para o especial. O especial contém igualmente três grandes mestres cujo trabalho marcou e mudou a história da BD.

Buddha, Osamu Tezuka. (8 volumes). Não deixem que o tamanho desta obra épica vos assuste, vale cada página. Tezuka é tão importante para a história das mangas e da banda desenhada como o Walt Disney é importante na história da animação. Trouxe características "manga" como os olhos enormes e as expressões de espanto para uma história supostamente sisuda como a vida de Buddha e influenciou entre outros Stanley Kubrick e Maurício de Sousa (sim, o da Mônica). Buddha é uma obra inesperada e surpreendente, mostra ao mesmo tempo o crescimento e desenvolvimento da vida e santidade de Buddha ao mesmo tempo que relata a violência e a sexualidade de outras personagens. Há muitos ângulos inesperados (para uma BD) e no fim ficamos com a ideia de que vimos um filme, um biopic da vida de Buddha e de personagens contemporâneas fictícias. É uma excelenente forma de mostrar o budismo e a sua doctrina pondo-a em contexto sendo ao mesmo tempo uma BD que custa a parar de ler. Para fãs de: Budismo ou curiosos, Astro-Boy, de mangas (embora este se leia na ordem ocidental), da série Tom Sawyer de Miyazaki.

A Contract with God e New York, Will Eisner. Um preferido pessoal. Tenho adiado falar nesta obra por achar que merecia mais destaque mas o tempo foi escasso. Will Einer foi mais importante do que eu sei explicar, hoje há os prémios Will Eisner nos Estados Unidos, os Oscars da BD. A contract with God foi uma das primeiras graphic novels, romance gráfico. Sem este livrinho muita BD de hoje em dia não existiria. Houve graphic novels antes mas nenhuma desta qualidade. É uma colecção de contos cuja acção se desenrola no mesmo bairro, a maioria dos habitantes são judeus emigrados nos Estados Unidos e entre os seus problemas pessoais a BD lida com a sua integração na sociedade americana e com as dificuldades das gerações seguintes. O desenho é muito realista embora em momentos de crises as personagens se tornem caricaturas delas mesmas ou se encolham ou afundam de formas pouco naturais que fazem o leitor querer dar-lhes um abraço. New york é uma antologia de vários volumes sobre a vida na grande cidade, sobre New York, desenhos de pessoas com demasiada pressa para viver, da vida dura de um emigrante no pós-guerra etc O volume Invisible people por exemplo lembrou-me de quando cheguei a Lisboa pela primeira vez. Dois dias depois tinha comprado quase toda a obra de Eisner. Para fãs de: Dostoevsky, Craig Armstrong, Maus: A survivor's tale, Kurt Vonnegut, Michael Chabon, José Carlos Fernandes.

Fraise et chocolat (2 volumes) e Je ne verrai pas Okinawa, Aurélia Aurita. Fraise et chocolat é quase um clássico de culto francês, facto que me manteve afastada do livro durante dois anos, até que recentemente descobri o Je ne verrai pas Okinawa... Aurita desenha com lápis fino de uma forma tão corriqueira que por um momento pensamos ser fácil desenhar. Tem o dom de fazer com que cada página pareça ter sido desenhada no autocarro, mas quando olhamos uma segunda vez apercebemo-nos que aquilo deve ter dado imenso trabalho. Fraise et chocolat relata as aventuras amorosas e sexuais de um casal francês no Japão. Os detalhes sexuais são muito explícitos e cómicos, não há detalhes Hollywoodescos de como tudo é perfeito à luz das velas e o primeiro volume é talvez a melhor descrição dos primeiros meses de uma relação sexual que já vi. O segundo volume acompanha uma relação mais madura mas ainda muito sexual assim como uma tournée BD e outros detalhes culturais do Japão. Os livros têm um sentido de humor muito apetitoso. Je ne verrai pas Okinawa é quase todo passado no aeroporto de Tokyo e ilustra de forma genial as dificuldades burocráticas de entrar num dos países mais fechados do mundo, o Japão. Apesar da autora ter dinheiro, de receber direitos de autor e de não ser uma ameaça para os trabalhadores japoneses as autoridades proibem-na de ficar os três meses que o visto permitia. Aurita tinha planeado visitar Okinawa nessa visita... É um relato dos tempos em que vivemos. Podem ver páginas de amostra aqui. Para fãs de: Small Favors, Milo Manara, nouvelle manga, Anais Nin, Tatsumi.

Elle(s) e Hollywood San (com Michael Sanlaville), Bastien Vives. Se algum dia fizer um especial sobre BDs para jovens este "miúdo" terá lugar de destaque. Digo miúdo porque é mais novo do que eu, o estúpido. Elle(s) segue um jovem de 26 anos que sem saber bem como, vê-se no meio de duas jovens de dezoito anos e das suas aventuras, desventuras e dos seus namorados também. Há sms, festas, cinema, amizades...Quem acha que está desligado das novas gerações pode aproveitar a leitura fácil. Hollywood Jan relata a história de um adolescente franzino, Jan (/ian/), que sofre como muitos de nós sofremos no liceu. Há rufias, professores arrogantes, colegas cruéis e o Jan sente-se invisível. E ainda por cima uma das professoras é amiga da mãe (também me aconteceu...) Para o ajudar há (I kid you not) o Arnold Schwarzenegger, o Sylvester Stalone e o Russell Crowe. Com a sua imaginação mortal e sedutora, o jovem Jan ora imagina conversas com os miúdos populares ora o Arnold a matar o pessoal todo. Mas e aquele hábito de pensar em voz alta?... Para fãs de: Wonder Years, Coupling, Le combat ordinaire. Parece-me especialmente indicado para leitores jovens (quer de idade ou mentalmente).

Abandon the old in Tokio, The push man e Good-bye, Yoshihiro Tatsumi - Já cá falei no senhor mas as únicas três obras traduzidas merecem mais destaque. Exactamente, o grande mestre japonês só tem três obras traduzidas no ocidente. É uma vergonha. Se há obra que nos faz abrir os olhos e apercebermo-nos que o Japão é um país longe dos estereótipos, com problemas como o nosso, com pessoas traumatizadas com o pós-guerra, com pessoas deprimidas, com gente que não gosta do trabalho, com filhos que não querem ser responsáveis pelos pais, com mulheres chatas, com homens ansiosos por ver pornografia num país altamente censurado, pessoas à beira de um esgotamento porque a vida não é nada do que tinham sonhado quando era novos etc são estes livrinhos. Qualquer história de Tatsumi permite-nos ao mesmo tempo sentir pena dos japoneses, desdém por personagens humanas (mas) cruéis, permite-nos descortinar um pouco as pressões de uma sociedade com uma hierarquia muito complicada e antever muitos esgotamentos. Temos sempre a sensação que estamos a desvendar um segredo muito bem guardado, que o Japão não são só gueixas, samurais, templos e ordem... Para fãs de:Dostoevsky, Aki Shimazaki, Osamu Tezuka, Coco Wang, Orhan Pamuk,para ver o Japão com outros olhos.

Où le regard ne porte pas...(2 volumes), George Abolin e Olivier Pont. Em 1906 a família de William troca Londres por uma vila italiana, os italianos não ficam muito satisfeitos e há uma tensão no ar. Mas para quatro miúdos de dez anos, isso não tem importância. Entre as aventuras dos petizes e as confusões dos adultos há sonhos, memórias de outros tempos, as crianças parecem lembrar-se todas dos mesmos acontecimentos. De outra vida? O segundo volume passa-se vinte anos depois, há vinte anos que os quatro protagonistas não se viam, há o matar saudades habitual, um ajustar de contas e uma viagem à Costa Rica para procurar o quarto rapaz. Entretanto os sonhos, visões são cada vez mais fortes e parecem ser pistas para o paradeiro do rapaz. Para fãs de: mistérios, Brian Weiss, BDs de época.

Especiais anteriores: Especial 5. Especial 4. Especial 4.5. Especial 3. Especial 2. Especial 1.

Especial BD online 1 e 2.

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