quarta-feira, setembro 26, 2007

Bélgica: uma explicação possível (IV)

Os estrangeiros:

Como eu há muitos na Bélgica. Fala-se muito de New York mas à sua escala Bruxelas é uma "salad bowl": há o quarteirão português, o quarteirão marroquino, italiano, turco, espanhol, grego, africano(com destaque para o Congo, ex-colónia belga), chinês etc Antwerp é na Flandres o equivalente à metrópole americana com o seu lado positivo e negativo: ao lado da maior comunidade gay, do maior bairro turco da Bélgica (só se fala turco e um pouco de inglês) e de uma forte presença judaica está também a maior concentração de seguidores do partido de extrema-direita flamengo; nem sempre a combinação corre bem. Os belgas parecem ter vergonha deste facto -e falei com pessoas que votaram nesse partido - mas não entendem o facto de se criarem guettos e de existirem milhares a viver cá sem falar pelo menos uma das línguas oficiais. Toleram o pessoal que trabalha na comissão mas não os consideram integrados no país, afinal de contas, nem pagam impostos cá, dizem.

Enquanto que noutros países parece haver uma distinção (ainda) entre os que nasceram no país porque os pais vieram para trabalhar e os que "sempre" foram do país, os belgas têm um orgulho extremo na mistura. Desde que fales francês ou flamengo e claro, não andes a vender criancinhas no parque recebem-te muito bem. Podes considerar-te português e ter a família a viver cá desde o tempo do teu avô ou ter acabado de chegar, não há crise. O único senão é que estão tão habituados aos estrangeiros que é preciso muito para os impressionar. Ser da Madeira resulta na maioria dos casos, da Asia nem tanto porque é mais comum. Houve uma altura em que não foi popular ser da Europa de Leste (numa semana receberam milhares e defendem-se dizendo que foi do choque) mas passou rápido. Vejo os meus colegas britânicos ainda um bocado relutantes e os belgas a ganhar reputação de frígidos, nórdicos, calmos etc mas sinceramente, se viajam no metro todos os dias com mulheres de burkas, mulheres com vestidos africanos coloridos, punks, indianos com ar cansado e cinquentonas cheias de jóias e de perfume, homossexuais de mãos dadas, miúdos da escola de várias etnias etc claro que não há muita reacção. No início andava toda contente ao escutar a babilónia dos transportes públicos mas agora já nem ligo. Gosto da mistura e do facto de haver sempre alguém a dar o lugar quando é preciso. Gosto de poder ir almoçar sushi pelo mesmo preço do indiano, do chinês ou do português. Gosto de conhecer pessoas de toda a parte do mundo o tempo todo. Mas gosto muito mais de ir sentadinha a ouvir música sem ninguém me chatear. E visto que muitos de vocês não se cansam de me dizer que a Bélgica não é um país turístico, gostava que me explicassem de onde vêm tantos turistas? Os mapas do metro têm mais saída que o jornal Metro.

Dos muitos estrangeiros há os que se integram e os que não sabem bem onde estão. Falar uma das línguas é essencial. Para mim é uma questão de educação,não faz sentido viver num país sem tentar falar a língua. Todavia há milhares que cá vivem há anos e só falam inglês ou turco. Sim, há um problema com os Britânicos e com os turcos. Ah! e com os marroquinos também. Não é que andem por aí a criar mafias mas fecha-se em comunidades e ninguém entra, ninguém sai. Um dos problemas dos guettos é serem fechados em si mesmos; houve confrontos sérios entre os turcos e os arménios com a polícia belga a levar porrada a tentar evitar que se matassem (a sério), uma loja centenária de vinhos foi vandalizada por muçulmanos que não sabiam a idade da loja e que queriam evitar tentações aos filhos. Os britânicos têm o seu próprio supermercado, creches, escolas etc Não conhecem belgas mas queixam-se muito. Quando menciono os vários pratos belgas que adoro é como ler um livro à minha gata: primeiro abre muito os olhos a ver de onde vem o som, depois luta para fugir.

A imigração é tanta que quando sou apresentada a alguém perguntam-me quais são as minhas origens e não de onde venho. A resposta pode parecer simples mas uma noite um velhote tramou-me, perguntou-me se era portuguesa (depois de falar sobre Lisboa) e quando respondi que sim e comecei a pensar que a conversa morrera, disse-me:

- mas nasceste em Bruxelas.

Depois de sentir o meu cérebro a sofrer um curto-circuito, admiti que sim.

- eu sou "bruxellois".

Num país dividido surge outro fenómeno:quem nasceu na capital bilingue não entra no ringue e é tido em conta por ambas as partes; um privilégio antes exclusivo ao rei.

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1 Comentários:

Às 9:56 da tarde , Blogger Lio disse...

ai o teu guia esta cada vez mais interessante, mas de certeza que a ter em conta como a vidinha (€€€€ anda por ca, de certeza que os mapas do metro nao sao para os turistas tugas.....loooool Va de ferias ca dentro.... que ja nao e mau.....

 

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