domingo, setembro 23, 2007

Bélgica: uma explicação possível (I)

Graças às perguntas de uma amiga apercebi-me que não falei muito sobre a Bélgica apesar de já cá estar há um ano, e pasmem-se, estar a gostar.

Parte um: multilinguismo

Antes de mais é preciso salientar que a Bélgica não é de todo um país simples. Existem cerca de 6 milhões de flamengos e 4 milhões de "wallons"(os que falam francês) e uma minoria alemã. Bruxelas é a única parte bilingue do país; toda a informação ao público deve estar disponível em francês e flamengo (os alemães estão no sudoeste do país e são um pouco como a Greta Garbo em NY: toda a gente ouve falar deles mas nunca ninguém os vê.) Para além da publicidade estar nas duas línguas, das placas, dos nomes das ruas etc as cidades também têm dois nomes, por exemplo, Liége/Luik e Leuven/Louvain. Esta situação explica o porquê de não se encontrar nada em francês na Flandres e nada em flamengo na Wallonie; os alemães têm menos sorte, por estarem enfiados na parte francesa têm as informações apenas em francês, contudo podem ter aulas em alemão em qualquer escola da área.

A parte que fala flamengo.A parte que fala francês.A parte que fala alemão.
Bruxelas.

Mapas de Wikipedia.

Para trabalhar numa loja ou num edifício público em Bruxelas é preciso falar ambas as línguas. Às vezes o nível de flamengo é básico nas lojas mas é enternecedor vê-los a balbuciar esforços; o francês dos flamengos é notoriamente melhor embora à segunda palavra o sotaque os revele imediatamente. Os flamengos têm o francês como disciplina obrigatória nas escolas durante todo o percurso escolar, o que totaliza pelo menos oito anos, todavia os wallons têm apenas um ano obrigatório de flamengo e depois a disciplina é opção. O nível de flamengo tem outras consequências: o primeiro-ministro do país tem obrigatoriamente de falar as duas línguas mas desde a segunda guerra mundial nunca houve um primeiro-ministro wallon pura e simplesmente porque nunca houve um com flamengo decente. O que não ajuda em nada ao crescente rancor entre as comunidades e à disparidade de opiniões sobre, bem, tudo.

O que nos traz à parte dois: Flandres vs. Wallonie

Se acham que as birras entre Lisboa e Porto se intensificam durante a temporada futebolística, acreditem que isso não é nada comparado com esta questão. Estamos a falar de pessoas sem uma língua em comum e com culturas e modos de vida completamente diferentes; partilham eventos históricos mas mesmo assim atribuem importância aos mesmos eventos de formas bem diferentes, até os feriados de homenagem à primeira e segunda guerra mundial são celebrados em dias e formas diferentes. Nós somos mais próximos (perdoem-me) aos espanhóis que os flamengos aos wallons. Convém lembrar que a Bélgica é uma monarquia. Qualquer belga honesto (desde que não seja taxista ou fã do Anderlecht) vos dirá que sem rei haverá duas repúblicas: a Flandres e a Wallonie.

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