segunda-feira, setembro 24, 2007

Bélgica: uma explicação possível (II)

Uma imagem comum: os belgas e os seus cães.

A independência:

Nunca se falou em independência como agora; no início do ano uma televisão wallona, a RTBF, mostrou um documentário falso (mas muito realista e mais credível que os noticiários da TVI) em que a Flandres declarava independência. A ideia era mostrar como é que a Wallonie se aguentaria nesse cenário possível. Os flamengos que viram mudaram de canal e viram que nos canais flamengos não havia nada então riram um bocado e os wallons tiveram um ataque cardíaco. Porquê? Entra a questão do dinheiro e da saúde (que no fundo também é só dinheiro). Basicamente a Flandres é rica e a Wallonie é pobre. Tchan nan! Os flamengos possuem turismo, serviços, agricultura, empresas e pura e simplesmente, dinheiro. O desemprego é praticamente inexistente. Na Wallonie há muito mais crime e menos estudos, mais (mas muito mais) desemprego, indústrias podres de velhas, turismo e agricultura. Claro que todos os países têm diferenças entre regiões mas uma análise global permite ver uma dicotomia que os flamengos usam em todas as discussões fundamentalistas: a Flandres quer e está pronta para a independência, a Wallonie não quer e não se aguentaria sozinha.

A saúde é outra questão engraçada: todos os habitantes da Bélgica (nativos ou não) têm um seguro obrigatório chamado "mutuel/mutualité"; basicamente pagamos todos os três meses (ou uma vez por ano) uma quantia fixa que cobre todos os serviços médicos e hospitalares. Quando vamos ao médico recebemos uma factura para enviar à mutualité e eles reembolsam; a quantia varia de mutualité a mutualité e de especialidade mas em geral ronda os 80%, temos igualmente um desconto na farmácia com valores semelhantes aos da ADSE em Portugal. Dou-vos o meu exemplo prático: paguei cerca de 60e no primeiro trimestre, fui à famosa médica espanhola e paguei 20e (sim, é assim tão barato) e a mutualité reembolsa-me cerca de 16e. Cada sessão de fisioterapia custa 18,30 e recebo 12e de volta. Claro que há um controlo, se precisarmos mais de 20 sessões de fisioterapia por ano a mutuel verifica com o médico etc (não é como em Portugal onde teoricamente se verificam as baixas). Como é que isto é possível? Bom, antes de mais o sistema funciona. 10 milhões de pessoas pagam a pequena percentagem no médico, o estado envia X para a saúde e o resto a mutualité paga. Na minha opinião o sistema funciona muito bem, não há listas de espera, há oferta de médicos e mutualités e para os casos mais sérios a cobertura é ainda maior.

Ora, por que razão é que isto é usado na discussão da independência? Porque, como os flamengos não deixam ninguém esquecer, os wallons apesar de serem menos dois milhões, pagam menos dinheiro e usam o serviço de saúde muito mais. Assim como usufruem do subsídio de desemprego muito mais. Na defesa da Wallonie posso argumentar que viver numa zona coberta de carvão, com fábricas a expelir gases o tempo todo e com níveis de criminalidade altos, eu também iria muitas vezes ao médico. E tomava comprimidos para dormir e trancava a porta à noite.

(amanhã falamos de política, uuuuh)

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